Apesar de nós sermos seres racionais, capazes de analisar situações e pensar de diversas formas, ainda somos imperfeitos e cometemos erros. Isso se dá porque nossa mente faz bastante uso de “atalhos” cognitivos – formas de pensar mais simples e diretas. É algo natural e, em grande parte, útil. Afinal de contas, não fossem esses atalhos, nós teríamos que ativamente pensar e elaborar todas as informações que nos vêm. Seriamos inundados de pensamentos e não faríamos mais nada a não ser pensar.
Evolutivamente falando, isso foi algo vital. Imagine seu antepassado numa floresta que vê um graveto que parece uma cobra. Se ele fosse parar para pensar demais, ele poderia ser atacado e morrer. Logo, criando um atalho como “parece com uma cobra = cobra”, ele teria mais chance de reagir logo e sobreviver. Ou se ele viu uma pessoa comendo uma flor roxa e passando mal. É mais simples e eficiente pensar que toda flor roxa faz mal do que testar ele mesmo e arriscar adoecer.
Porém, no que nós evoluímos, nossa mente não deixou de se utilizar desses atalhos. E apesar desses atalhos serem úteis numa floresta, não necessariamente nos servem no mundo moderno. Notavelmente, esses atalhos podem ser danosos quando se trata de relações sociais. Os mesmos atalhos que nossos antepassados usaram para cobras ou plantas acabam sendo usados para pessoas. Por exemplo, da mesma forma que nosso antepassado pode ter rotulado que toda flor roxa é ruim, nós acabamos rotulando os outros. “Fulano é egoísta”, “Fulana é falsa”. Nem sempre isso é feito por mal, é uma consequência de como nossa mente evoluiu. Contudo ocorrem momentos em que esses atalhos acabam causando mais danos do que ajudando.
Ou seja, é importante que nós saibamos quais eles são e como se fazem presentes. A seguir, mostro a vocês uma lista de alguns dos principais erros de pensamento. Veja se você já se viu cometendo algum deles:
Pensamento do tipo tudo ou nada (também chamado de pensamento em preto e branco, polarizado ou dicotômico): Você enxerga uma situação em apenas duas categorias em vez de em um continuum.
Exemplo: “Se eu não for um sucesso total, eu sou um fracasso.”
Catastrofização (também chamado de adivinhação): Você prevê negativamente o futuro sem levar em consideração outros resultados mais prováveis.
Exemplo: “Eu vou ficar muito ansioso. Eu não vou conseguir trabalhar.”
Desqualificar ou desconsiderar o positivo: Você diz a si mesmo, irracionalmente, que as experiências positivas, realizações ou qualidades não contam.
Exemplo: “Eu realizei bem aquele projeto, mas isso não significa que eu sou competente; só tive sorte.”
Raciocínio emocional: Você acha que algo deve ser verdade porque você “sentiu” intensamente (na verdade, acreditou), ignorando ou desvalorizando as evidências em contrário.
Exemplo: “No trabalho, eu sei fazer bem muitas coisas, mas eu ainda me sinto um fracasso.”
Rotulação: Você coloca em você ou nos outros um rótulo fixo e global sem considerar que as evidências possam levar mais razoavelmente a uma conclusão menos desastrosa.
Exemplo: “Eu sou um perdedor. Não sou uma boa pessoa.”
Magnificação/Minimização: Quando você se avalia ou avalia outra pessoa ou uma situação, você irracionalmente magnifica o lado negativo e/ou minimiza o positivo.
Exemplo: “Receber uma avaliação mediana prova o quanto eu sou inadequado. Tirar notas altas não significa que eu seja inteligente.”
Filtro mental (também chamado de abstração seletiva): Você dá uma atenção indevida a um detalhe negativo em vez de ver a situação como um todo.
Exemplo: “Como eu tirei uma nota baixa na minha avaliação [que também continha várias notas altas], significa que eu estou fazendo um trabalho malfeito.”
Leitura mental: Você acredita que sabe o que os outros estão pensando, não levando em consideração outras possibilidades muito mais prováveis.
Exemplo: “Ele acha que eu não sei nada sobre esse assunto.”
Supergeneralização: Você tira uma conclusão negativa radical que vai muito além da situação atual.
Exemplo: “[Como eu me senti desconfortável na reunião], eu não tenho as condições necessárias para fazer amigos.”
Personalização: Você acredita que os outros estão agindo de forma negativa por sua causa, sem considerar explicações mais plausíveis para tais comportamentos.
Exemplo: “O vizinho foi rude comigo porque eu fiz alguma coisa errada.”
Afirmações com “deveria” e “tenho que” (também chamados de imperativos): Você tem uma ideia fixa precisa de como você e os outros devem se comportar e hipervaloriza o quão ruim será se essas expectativas não forem correspondidas.
Exemplo: “É terrível eu ter cometido um erro. Eu sempre deveria dar o máximo.”
Visão em túnel: Você enxerga apenas os aspectos negativos de uma situação.
Exemplo: “O professor do meu filho não faz nada direito. Ele é crítico, insensível e ensina mal.”
Conclusão
Esse acaba se tornando um tema especialmente relevante dado o momento que passamos. É comum como reação ao medo de adoecer termos pensamentos de Catastrofização (“Vou ficar doente e ser internado”) ou de Supergeneralização (“vi um vizinho sem máscara ontem, ninguém está preocupado”), dentre outros.
Existem situações em que pensamentos assim são úteis ou corretos? Com certeza. Porém, não devemos partir do princípio de que eles estão corretos sempre, é importante questionarmos a validade dos nossos pensamentos. Podemos estar sendo injustos com nós mesmos (esquecendo de nossas qualidades, por exemplo) ou com os outros (rotulando ou julgando). Não se trata de estar certo ou errado, mas sim de ter uma avaliação de algo ou alguém mais realista, levando em consideração tudo que se apresenta, e não apenas preconcepções e julgamentos precipitados. Experimente olhar os pensamentos que você tem e ver se algum deles pode se encaixar nas categorias acima. Eles podem dizer muito sobre como você enxerga o mundo e a si mesmo.