Porque esta frase é tão necessária e difícil de ser dita?
Vivemos numa cultura que não acolhe “perdedores”. Doença e morte, ao invés de serem vistas como parte da vida, são tratadas de alguma forma como um fracasso – do corpo, da medicina, dos hábitos – enfim, o reverso de nosso conceito vigente de sucesso.
-“Levanta menino!”; -“Enxuga essas lágrimas!”; -“Claro que você dá conta!”… Frases muitas vezes proferidas por pais e educadores na melhor das intenções. Queremos filhos independentes e auto-suficientes.
Não preparamos nossas crianças adequadamente para socializar e viver em comunidade tão bem quanto as preparamos para “vencer na vida”. Ser um vencedor, por sua vez, está associado a um contexto altamente competitivo onde prevalece o estigma de heróis solitários que matam dragões.
A vida, contudo, não é um filme de aventura e diante do adoecimento, seja físico ou mental, heróis solitários sucumbem.
Adoecer, independente do nível de gravidade, é para muitos a primeira oportunidade na vida em que confrontam sua vulnerabilidade, a delicada força da natureza que constrói e destrói independente de nossa vontade.
Diante dessa realidade bruta que a doença invoca a maioria de nós, inspirados na ideia do herói, subimos em nossos cavalos brancos e vamos à guerra para “vencer” a doença. Isto às vezes dá certo e a vida segue.
No entanto, para muitos quadros clínicos, não se trata apenas de um evento passageiro, mas de algo que pode ir das avassaladoras doenças graves como o câncer, a doenças crônicas e degenerativas que entram na vida para ficar.
Como lidar com isto?
É quando entendo que a doença se torna nosso professor, nosso educador e a voz do pai compassivo. Um mestre que nos ensina que certas “batalhas” não se vence sozinho. É nesse contexto que ouço pacientes, não sem dificuldade, reconhecerem a importância de suas redes de ajuda.
Alguns sentam-se pela primeira vez ao meu lado e quando pergunto com quem podem contar a resposta é com frequência :-“Com ninguém!”. Ai vamos pacientemente reconhecendo a natureza da ajuda e da rede invisível que os cerca.
Uma ajuda pode vir de um livro, de um profissional de saúde, da recepcionista atenciosa de um hospital. Uma ajuda pode vir da palavra amiga de um vizinho e até de um desconhecido em seu facebook. A ajuda está com frequência bem ao lado, mas não temos olhos pra reconhecê-la a não ser quando não há mais jeito a não ser buscá-la.
Pedir ajuda por sua vez, pode vir desde um lugar de desespero ou de um lugar de reconhecimento. Reconhecer que precisamos de ajuda não é fraqueza, mas franqueza, sobretudo com a gente mesmo.
Se vier do desespero, pedir ajuda vai vir também cercado de mágoa. Sinto em muitos clientes que pedir ajuda é arriscado. Eles já tem um não em suas mentes, mas lá no fundo esperam um sim. Receber o não a um pedido é confirmar o abandono e a solidão que de fato sentem. Receber o sim a um pedido de ajuda é algo com frequência inesperado por eles, embora o mundo estivesse sempre ali de braços abertos.
Se o pedido não é feito, como sabê-lo?
Costumo dizer a esses clientes – “Se você já tem o não na sua cabeça para seu pedido de ajuda, ao pedir de fato, o que você tem a perder? O “não” você já tem!
Pedir nos coloca na vulnerabilidade que passamos a vida toda evitando porque para muitos, estar vulnerável, é ser um perdedor. A vulnerabilidade, contudo, nos permite acessar nossa humanidade e quando nos vemos humanos, também descobrimos nossas forças.
Sustentar uma imagem de “herói” é pois um desserviço para a cura e a recuperação porque certas batalhas exigem um exército. Nele estarão seus melhores amigos, seus parentes mais queridos, seus médicos, psicólogos, terapeutas e quem mais for convidado a essa viagem de aprendizado e transformação.
Acredite, mesmo que você se sinta só, um sistema inteiro é afetado e você não está de fato nunca só!
É chegada a hora de convocar seu “exército”.
Pedir ajuda é, sobretudo, um ato de força e fé! Lembrando sempre que o outro aceitar ou não o seu pedido não necessariamente diz do amor do outro por você, mas de suas reais possibilidades.
Um “não” a um pedido não fala sobre você, mas sobre as possibilidades do outro. Sim, pedir ajuda vai lhe convidar ao exercício da compaixão pelo outro, por todo aquele que não dá conta de lhe atender.
Para este que não dá conta, haverão outros que darão. Portanto, novamente, você não tem nada a perder.
Construa sua rede de ajuda. Liste o nome de pessoas, livros, filmes e tudo aquilo que você quer ter na sua rede de ajuda. Com as pessoas listadas, abra uma conversa. Explique o que se passa, ouça como está essa pessoa diante disto, troque idéias sobre possibilidades de ajuda que considerem eventuais limitações. Busquem juntos soluções.
Pedir ajuda não é uma ordem, é o início de uma negociação!
Sobretudo, entenda que basta ser grato(a) ao receber. Acompanhei uma paciente ao hospital algumas vezes e em todas as vezes ela me pagou pela gasolina gasta em seu transporte. Assim foi até o fim. Alguém que partiu sem saber receber. Sem permitir ser amada.
Ao final, pedir ajuda e receber com gratidão de quem conseguiu lhe atender é na verdade um grande exercício de amor. Toda doença trás um convite ao amor. Cabe a você aceitar ou não.